Modelo híbrido de tributação de VoD é "consenso possível", mas detalhes ainda serão determinantes

As diretrizes para um modelo híbrido de cobrança da Condecine para o video on demand, aprovado na última reunião do Conselho Superior do Cinema (CSC), finalmente parece ter encontrado um caminho de consenso, ou pelo menos de concordância entre a maior parte do mercado. O modelo permite que as empresas que prestam serviços de VOD optem por pagar em cima do catálogo de títulos oferecidos ou uma taxa fixa (flat-fee) por assinante ou transação (venda avulsa de conteúdos) que realizem. A deliberação do CSC ainda depende de detalhes que serão finalizados antes de uma minuta de lei ser aprovada pelo colegiado e então encaminhada para o Congresso. 

"Quando começamos a discutir o assunto, havia um ambiente de tensão no setor. Havia dissonâncias sobre a visão da Ancine sobre o assunto. O caminho foi o de fazer o que é possível no ambiente de tensão", disse o secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, João Batista Silva, durante o Brasil Streaming 2018, evento realizado pela TELA VIVA e a TELETIME nesta segunda, 11, em São Paulo. "Buscamos o consenso possível, porque o perfeito não há. Foram oito meses de diálogo para chegarmos a uma matriz já aprovada. A proposta é do próprio setor e referendada pelo CSC", completou.

Segundo o assessor da presidência da Ancine Magno de Aguiar Maranhão Júnior, para a próxima reunião, ficou o compromisso do ministro Sérgio Sá Leitão de já levar um texto com valores para a norma. "Temos que fazer a regra mais isonômica possível para todos", disse o assessor da Ancine.

O MinC agora busca um relator para o projeto de lei instituindo o novo modelo, conta João Batista Silva. "Apesar do ambiente política tumultuado, entendemos que um projeto bem pactuado no setor consegue tramitar". Já a definição por uma medida provisória ainda carece de uma análise da Casa Civil. "De qualquer forma, acreditamos que isso se resolva este ano", diz.

Quase consenso

O "consenso possível" foi viável pela percepção de todo o setor de que a insegurança jurídica inviabilizava novos investimentos em serviços de VOD. Segundo Fernando Magalhães, diretor de programação da Claro Brasil, o modelo atual de incidência de Condecine, por título, "é um desastre" para o modelo de VoD. Segundo ele, no atual modelo, a Claro não é o agente passivo do imposto, o que muda na nova proposta. "Aceitamos assumir o papel de agente passivo para ajudar a deslanchar o mercado, da forma como está, isso não é possível", disse.

Segundo Ana Paula Bialer, advogada do escritório BFA Advogados, ninguém quer pagar mais tributo. No entanto, diante da insegurança jurídica e de uma decisão política de resolver a indefinição, todos aceitam "pagar alguma coisa". Para a advogada, o valor que se concorde pagar deve ser, em alguma medida, revertida ao próprio setor.

Os modelos de cobrança não precisam ser, diz Bialer, equiparáveis em termos arrecadatórios, seguindo uma lógica semelhante à opção por declaração simples ou completa no imposto de renda de pessoa física, em que a escolha é pelo modelo que cobra menos.

Cícero Aragón, diretor-presidente da programadora Box Brazil, também concordou com o modelo híbrido. "Estamos lançando o Box Brazil Play, com mais de mil títulos. É um catch-up, uma extensão da plataforma, mas que permite novos assinantes. Como começamos com base zero, faz mais sentido o modelo de cobrança transacional, não por catálogo. Talvez em algum momento faça sentido mudar para o pagamento por catálogo", disse.

Para Magalhães, da Claro, é essa flexibilidade que permitirá novos investimentos em VOD, e não se trata apenas de permitir investimento de players de menor porte.  "O modelo de cobrança por transação pode funcionar para Netflix ou o Now. Mas para criarmos um bundle de três canais para assinantes da banda larga, por exemplo, pode ser inviável. A tributação não permitiria o investimento", explica.

Incentivos e dúvidas

Sobre a adoção de isenções e descontos, dependendo do tamanho do acervo, do volume de conteúdo nacional e, sobretudo independente, também é visto como uma solução viável para fomentar novos conteúdos nacionais, sem adotar cotas. "Toda plataforma vai buscar suas produções originais e se tiver um incentivo para isso, principalmente nas independentes, melhor", diz Aragón, da Box Brazil.

Mas se no debate o modelo se mostrou razoavelmente consensual, da plateia vieram manifestação mais reticentes. Júlio Worcman, diretor da programadora Curta, chama a atenção para a falta de detalhes sobre os valores de flat-fee e da cobrança por catálogo. Segundo ele, a depender do valor, isso pode inviabilizar o modelo. "Se um conteúdo é vendido a R$ 2 por transação, uma taxa fixa alta pode inviabilizar o modelo", disse. Segundo Magno Maranhão, até a próxima reunião do Conselho Superior de Cinema, em agosto, caberá à Ancine a negociação e definição destes detalhes junto à área econômica do governo e fazer as simulações. Outra preocupação da Ancine até lá será definir as faixas e critérios de isenção da Condecine VoD, justamente para estimular a programação nacional.

Fábio Lima, da Sofá Digital, também chama a atenção o risco de dupla tributação em relação à Condecine Remessa, estabelecida no Artigo 32 da MP 2.228/2001. Ele. Questionou a Ancine se ao optar por recolher a Condecine VoD, um distribuidor como a Netflix, por exemplo, estaria isenta da Condecine Remessa. Para o assessor da Ancine, sim, mas depois, em conversa com este noticiário, Magno Maranhão explicou que de fato será necessária uma alteração nesse artigo da MP 2.228 para deixar claro que as Condecine são mutuamente excludentes. (Colaborou Samuel Possebon)

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