Canais pagos lançam plataformas OTT

Carlos Ragazzo, pesquisador da FGV/RJ, abriu o painel "Streaming S/A – A Nova Economia Audiovisual" do "Brasil Streaming" – seminário organizado pela TELA VIVA e pela TELETIME nesta segunda, 11/06 – falando da necessidade de um aperfeiçoamento regulatório diante do surgimento de novas tecnologias no setor. "Se hoje em dia há uma dificuldade de regulamentação, significa que as regras que foram estabelecidas lá atrás já não funcionam mais", esclarece. Para Ragazzo, o momento é de transformação na indústria, e a grande mudança, especialmente por conta da ascensão dos serviços  OTT, é a inversão do papel do consumidor, que passou de passivo para ativo, e acostumou-se a ter uma oferta de conteúdo customizado de acordo com o seu perfil pessoal. "Diante desse cenário, a TV por assinatura precisa de oportunidades para evoluir, uma vez que ela já está sofrendo uma redução do número de assinantes enquanto o OTT vê seu consumo aumentar cada vez mais", completa.

Apesar disso, ele assume que o cenário atual ainda não está cristalino e, em sua opinião, o melhor a fazer seria aguardar os novos rumos do mercado antes de atuar nessa simplificação de regulação – processo que deve chegar à TV por assinatura também. Segundo ele, as empresas que oferecem conteúdos pela Internet atuam como produtoras de distribuidoras e  assim conseguem, por meio dessa estratégia reduzir os custos de transação. "A solução regulatória esperada seria justamente a revogação da restrição à verticalização para as TVs por assinatura", disse. Para ele, regras que foram feitas em um contexto diferente não  respondem aos desafios concorrenciais que se colocam hoje.

Novos mercados

Como apontado por Britto, os novos mercados estão surgindo. Vanessa Oliveira, diretora de projetos digitais da VIU – braço da Globosat – está à frente de um desses cases. A VIU surgiu a partir do momento em que o grupo identificou que os papéis dentro do setor eram "líquidos", ou seja, já não era mais possível distinguir canal, talento, influenciador, site, rede social etc, pois todos podem experimentar essas diferentes posições.

Ao contrário dos caminhos sugeridos – esperar a regulamentação antes de lançar novos produtos – a Globosat não aguardou e transformou todos os seus canais em verdadeiras marcas, que hoje estão presentes no linear, no digital, atuam juntas, separadas e trabalham até com concorrentes. "A concorrência hoje é só situacional. Gosto de falar que vivemos em uma Collab.", diz Vanessa. A executiva conta ainda que, nos últimos anos, a prioridade do grupo foi transformar seus canais em marcas com valores declarados e de propósitos claros: "Isso aproxima a marca do consumidor. Se ele não se identifica com os valores da marca, logo a abandona.". E, em relação ao lançamento de novos conteúdos, ela alerta: "Não adianta sair distribuindo conteúdo sem entender bem as plataformas. É necessário criar o conteúdo primeiro e, aí, sim, pensar em qual é a plataforma mais adequada para ele.".

O painel trouxe o case de um novo modelo de venda e distribuição de conteúdo pela internet,  a Tamanduá TV, plataforma de produção independente do canal Curta! que está em fase de lançamento. Dividida em três pacotes diferentes – "Cine BR", "Cine Euro" e "Cine Docs" – ela está disponível, inicialmente, aos assinantes da NET, mas a ideia é que ela viaje por outras operadoras também. "O objetivo final é ser um marketplace de acervos cult, com essa operação que pretende manter-se pequena, de nicho.", explica Juca Worcman, à frente do canal e também da Tamanduá TV.

Para a Associação Brasileira de Provedores OTTs (Abotts), ainda há desafios para empresas entrantes no segmento de distribuição de conteúdos OTT. A associação busca apoiar as empresas brasileiras de OTT em suas multiplicidades tecnológicas e funcionais, além de serviços de aplicações e de distribuição de conteúdo audiovisual, soluções, informação e serviços de internet, entre outros. Com essa missão principal, a associação estabeleceu alguns pontos de ação em sua agenda primária: regulamentação; tributação; combate à pirataria; e neutralidade de rede. Alexandre Britto, representante presente no painel, acrescenta pessoalmente uma outra questão – a viabilização e o estímulo ao desenvolvimento de novos negócios em todo o ecossistema OTT.

O primeiro passo a ser dado pela Abotts, de acordo com Britto, será a criação de comitês específicos divididos em três frentes distintas de trabalho: conteúdo (produtor, gestor e detentor de direitos); distribuição (provedor, agregador e programador); e consumo (plataformas, dispositivos e fabricantes). "O que falta no setor é isso: organizar assuntos, dividir pautas e temas e aí, sim, levá-los ao legislativo.", opina. Dentre as principais barreiras, desafios e oportunidades dos diferentes braços do setor neste momento, Britto aponta os principais: para o OTT, por exemplo, a grande barreira é a questão da infraestrutura (relacionada às novas tecnologias), o maior desafio é enfrentar a incerteza regulatória e tributária e a oportunidade é o surgimento dos novos mercados e, por consequência, da publicidade dirigida.

A Abotts hoje conta com cerca de dez associados e há em sua base serviços que ainda não foram lançados. "Justamente por medo dessa regulação.", revela Britto.

Há espaço para todos os novos serviços?

Com o surgimento de diversas plataformas de venda e distribuição de conteúdo na internet, fica o questionamento: e o consumidor dentro desse contexto? Ele acumulará diferentes assinaturas, de diversas plataformas, ou haverá um agregador de todos esses serviços? E, para além disso: há espaço para todos esses novos serviços no mercado?

Para Alexandre Britto, da Abotts, o surgimento da figura de um agregador desses serviços é inevitável. Para ele, é provável também que exista um filtro natural, que fará com que só os melhores permaneçam em atividade.

Já Vanessa Oliveira, diretora de projetos digitais VIU, discorda: "O surgimento de serviços variados vai gerar uma briga pelos melhores conteúdos, e se destacará no mercado quem os tiver. O surgimento de um possível agregador ainda deve demorar, uma vez que estamos falando de empresas de portes enormes envolvidas.". Worcman complementa: "No entretenimento, existe o conceito da 'indústria do lançamento', isto é, chama mais atenção aquele que acumula mais lançamentos em seu portfólio". Isso significaria que empresas pequenas e nichadas em teoria não teriam espaço no mercado. "Há uma falta de iniciativa de criação de espaços para nichos de conteúdo, tudo vem em pacotes grandes, com todos os gêneros", critica. E finaliza: "Há muito conteúdo de nicho, mas não plataformas para abrigá-los."

A diretora de projetos digitais da VIU conclui: "há espaço para todos, o ponto é a empresa entender quem ela é e onde ela se encaixa – e isso vale para as plataformas e para os talentos também. Dinheiro investido não é tudo – ainda dependemos da qualidade dos títulos e do engajamento que eles geram. O momento é de aprender a desaprender."

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